domingo, 18 de outubro de 2015

Ventos e tempestades



No próximo dia 21 de Outubro o Sr. Presidente da República, para efeitos do disposto no art.º187 da Constituição da República, vai iniciar a audição dos partidos com representação parlamentar.
Amanhã, 2ª feira, vai ter uma reunião com Pedro Passos Coelho.
Tendo em atenção as características políticas e pessoais de Sua Excelência e as declarações por ela proferidas no decurso do processo eleitoral no que respeita à indigitação de um novo governo, a curiosidade é nenhuma.
De facto, o seu manto protector dos interesses do PSD esteve sempre presente, a sua inesquecível confissão de ter muito reflectido sobre todos (todos) os cenários - ao ponto de não ter comparecido às comemorações da instauração da República no passado dia 5 de Outubro -  e as suas comunicações ao país (“soluções governativas construídas à margem do Parlamento, dos resultados eleitorais e dos partidos políticos” não serão admissíveis; “os portugueses têm o direito e o dever de exigir um Governo estável em duradouro“, “é extremamente desejável que o próximo Governo tenha um apoio maioritário e consistente na Assembleia da República”; “que fique claro: nos termos da Constituição, o Presidente da República não pode substituir-se aos partidos no processo de formação do governo e eu não o farei”) suscitam poucas interrogações sobre o desfecho daquelas reuniões. “Tínhamos imaginado todas as possibilidades (…) estamos a seguir os passos que mais ou menos tinham ficado delineados” (atente-se no “nós” majestático). Isto no que respeita ao Aníbal.
Quanto ao António, lançou-se numa impossibilidade orçamental: o aumento da despesa, a redução da receita e a diminuição da dívida e do deficit. É a quadratura co círculo. O desfecho das suas negociações com a CDU e o BE não é tão claro como por aí se anuncia.
Finalmente, no que respeita à dupla Pedro/Paulinho, é inevitável estarem a sofrer as consequências da sabedoria popular: “quem semeia ventos colhe tempestades”. O mau semeador é o responsável pela qualidade da colheita e as tempestades são o resultado da natureza ou da irresponsabilidade ou da incompetência humanas.
Portugal vive hoje na incerteza política e na certeza (que só cegos mentais não admitem) de se manifestarem no curto prazo as consequências de uma não curada doença financeira. Prenúncio? As recentes preocupações da CE sobre o Orçamento de Estado para 2016.
Porquê incerteza? Porque se semearam ventos.
Ventos de arrogância e de ameaça. Arrogância numa governação de quatro anos que foi cega, surda e muda a qualquer tipo de entendimentos e que, por facciosismo ideológico ou por incompetência política, acordou muito tarde para essa necessidade. Resultado? O actual impasse com o maior partido da oposição.
Ventos de ameaça do “nós ou o caos”, de “nós ou o regresso da Troika”, de “nós os que resolveram uma grave crise com o povo e o seu pacífico sacrifício” (suprema e despudorada hipocrisia). O “flop” financeiro continua à sombra da dissimulação e da mentira com a conivência dos cérebros europeus: o deficit e a dívida pública continuam presentes e cada vez maiores. Existe uma crise do sistema bancário português, de que o escândalo do BES é apenas uma ponta a descoberto. A soberania financeira não se recuperou, contrariamente ao repetidamente afirmado do só agora europeísta vice-primeiro-ministro PP.
Ventos de subserviência e de perda de soberania, confirmados pela recente exigência da Comissão Europeia para a apresentação das linhas do orçamento de 2016, independentemente dos indiscutíveis constrangimentos políticos que Portugal hoje vive, ao recusar a proposta que lhe foi comunicada pelo o ministro das finanças a Sr.ª Dr.ª Maria Luís: as principais medidas do orçamento “têm que” ser-lhes comunicadas “já” e não após a constituição do novo governo.
Seja como for, o ainda governo que as apresente, no âmbito das suas actuais responsabilidades, não para satisfação da exigência da CE ou do pedido do PS mas, sobretudo, para informação do cidadão português.
Tanta hipocrisia, tanto jogo de cintura, tantos interesses, tanta mentira.
Uma tristeza.

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