quarta-feira, 27 de março de 2013

A intolerável "tolerância de sentido único"



O homem tem o dever como homem de ser tolerante, mas a tolerância é, por vezes, de sentido único o que conduziu no passado não apenas a falsificações, mentiras, corrupção, espoliações, nepotismos e outros tipos de favorecimento (o que poderia ser apenas"menos tolerável") mas, também à abjecção: ditaduras, prisões em massa, assassinatos, massacres, guerras. 
Pense-se no "nazi" que eliminou judeus, ciganos, eslavos em nome da pureza rácica, no “católico” que apagou história e homens em nome de uma “verdade”, no "sionista" que espolia milhões de palestinianos das suas terras em nome de um “direito histórico” e que constrói muros que de vergonha nada devem ao de Berlim, no “estalinista” que tornou a Sibéria um imenso campo de concentração, no “polpotiano” que empilhou milhares de crânios “mal pensantes”, no "imperialista" que avilta e mata civis por petróleo, no “genocida esclarecido” que elimina qualquer vestígio cultural ou religioso, seja ele arménio, curdo ou outro, ou no "fundamentalista islâmico" que massacra o “infiel”, incluindo o da sua própria crença. Etecetera. Tudo intolerável e, em evidentes casos, abjecto e resultado de uma “tolerância de sentido único". 
O nosso país está cheio dos que se consideram uma classe superior, muito tolerantes para os deles mas prontos a sacrificar os que a ela não pertencem. A maioria é, dizem, superiormente preparada. Mas só na teoria. Não possuem experiência, sabedoria, bom-senso. Ignoram a simples e palpável realidade.
Para que serve um cirurgião com superiores conhecimentos de anatomia se nunca operou? Para que serve um engenheiro cheio de complexas e trabalhosas teorias se nunca as aplicou a uma realidade? Para que serve um licenciado em direito que sabe o código civil de frente para trás e os códigos romano e napoleónico se desconhece o tribunal? Para que serve um economista (macro ou micro) que tudo leu e estudou o antes e o depois de Adam Smith se nunca geriu fosse o que fosse ou que de óptimo aluno passe logo a “director-geral” de um organismo estatal? 
E, no entanto, podem ser todos doutorados, professores, possuir elevadas e comprovadas qualificações académicas. "Quem sabe faz, quem não sabe ensina".
Acontece o mesmo na política.
Para que serve um político directamente saído das “juventudeszinhas partidárias” ou nomeado pela alta finança ou pela maçonaria?
Todos são mestres na teoria e aprendizes na prática e o orgulho e a falta de humildade (por vezes a imbecilidade) impedem-nos de adquirir a experiência tal como ela própria o exige: a começar de baixo.
Para a miserável situação a que se chegou, contribuíram quase todos e todos têm para ela explicações, culpas e vagos remédios.
Referência a incompetência, corrupção, vergonhosos conluios e a ganância de poder e prestígio? Não. Mea culpa? Não. A culpa é sempre dos outros, “...é do pólen dos pinheiros, do urso que hiberna, da encefalopatia espongiforme bovina, da Eva que comeu a maçã, dos que usam gravata...”. Deles? Nunca!
Causa pública? Não sabem o que é. Pobreza pública? Ignoram-na.
Ah!, tantas comoventes declarações, tanta sacudidela da água do capote numa total ausência do espírito de servir, com uma enorme preocupação de poder, numa chafurdice nunca vista. Mas, candidatam-se, oferecem o seu superior e desinteressado saber. 
São todos amigalhaços que só a inveja separa porque ideais só proclamam os que lhe convêm   
Sei que o homem é mau e que mau continuará a sê-lo, mas existe um particular obstáculo para que o homem mude: o alheamento (quando não o apoio) cúmplice do poder político, económico, religioso, profissional.
A cambada que nos rodeia à esquerda, ao centro e à direita é fruto da nossa ingénua tolerância. A cambada e a sua cáfila que nos rodeiam têm apenas a “tolerância de sentido único”: para os deles e com o sentido único do dinheiro, do poder, do prestígio, da influência. Tudo com a prepotência que a impunidade dá.



terça-feira, 19 de março de 2013

O "imperialismo" e o embondeiro

                            Recordações da guerra -  Moçambique (1970-1972), Omar

“...puras verdades, já por mim passadas. Oxalá foram fábulas sonhadas. “ Luís de Camões.

Lembro-me de nesse mês de Janeiro 73 já nos considerávamos “cocuanas“ e não os inexperientes “xecas“ recém-vindos da Metrópole, do “puto“ como lá se dizia.
A nova missão da CENG 2736 era Omar, na margem sul do rio Rovuma.
Omar, no final de uma picada por nós aberta durante a “Nó Górdio“ (1970), tortuosa, ao longo
de território perigoso e que agora era necessário alargar e desmatar, vinte metros de cada lado. Omar, primeira posição portuguesa a render-se aos “turras” depois do 25 de Abril.
Conheci-a muito bem, estive nela enfiado muito mais de um mês depois de terem sido concluídos os trabalhos, um ano antes, de abertura de um estacionamento e de construção de uma pista de aviação.
Sim lembro-me, passados mais de trinta anos, de Omar escaldante e inóspito buraco com a sua tabuleta com a direcção e os kilómetros para Lisboa.

Numa soalheira manhã para lá partimos de Mueda, com uma muito forte e experiente protecção e a minha experiência bem gravada na cabeça, experiência resultante de erros passados, alguns mortíferos.

                                  http://3ccomandosmocambique.multiply.com/video/item/137/137 

Nunca atravessar uma clareira (em geral uma "machamba") como se fosse o Rossio num Domingo sem trânsito. Por o termos feito, como “xecas“ que na altura éramos, sofremos dois mortos. Foi puro e simples tiro ao alvo.
Nunca abrir o estacionamento no alinhamento da picada recém-aberta porque assim éramos um alvo bem para o morteiro. Decidi depois que a nossa “pernoita” devia estar desviada num cotovelo. Era aí que parávamos, que construíamos as nossas barreiras de terra e que dormíamos debaixo das viaturas. Acabaram-se as angústias de meio da noite com o som da saída, o silvo da trajectória e os rebentamentos antes e depois de nós.
Ao longo daqueles quase dois anos de guerra, testemunhei a invisivel passagem do cavalo esverdeado do Apocalipse no qual cavalga, com outras, a fome. 
Aprendi a gostar de comer  cebolas cruas como se maçãs fossem, a desenterrar nas machambas a gostosa mandioca. Passei a rejeitar maquinalmente pêssego em calda, carne e sardinhas enlatadas, leite condensado, enfim quase tudo aquilo que fazia parte da ração de combate. 
Comi cobra, encontrada de manhãzinha ao acordar, enroscada no calor do motor da máquina debaixo da qual dormia, e é comida sensaborona. 
Comi porco-espinho, muito rijo e adocicado. 
Percebi como nas guerras de antigamente se comia tudo: ervas e raízes, cães, gatos e ratos, cavalos e homens. 
Percebi, também, como nas guerras de hoje se continua a comer tudo e porque é que desaparecem populações inteiras de jardins zoológicos e de aquários: é a passagem do cavalo esverdeado. No meu caso era um cavalo sem côr no qual cavalgava o enjôo.
Enfim lembranças que não gosto de lembrar.


Eram pouco mais de sessenta kilómetros sempre planos, de mato rasteiro que permitia um progresso rápido ou de embrenhada floresta que dificultava os trabalhos e lhes diminuía o ritmo. 
Havia de tudo, desde o pequeno e frágil arvoredo até às velhas e enormes árvores. Para o derrube destas como a potência de uma só máquina era insuficiente recorríamos ao expressamente proibido, pelos chefes instalados em Nampula, técnica que denominei “da bicha de pirilau“. 
Consistia ela em colocar-se atrás da primeira máquina, de lâmina encostada ao tronco, mais duas máquinas em bicha, triplicando assim a força total. Era remédio santo.
Mas há sempre excepções e ela ocorreu na forma de um embondeiro plantado mesmo no meio do enfiamento da nossa picada. 
Depois de tudo tentado e de uma boa hora de trabalho, desisti. 
Resolvi armar-me em paisagista, em técnico de prevenção rodoviária, e fazer uma bela rotunda, quebrando a monotonia daquela imensa recta, evitando hipotéticos acidentes por excesso de velocidade ou por adormecimento ao volante. 
O imponente embondeiro lá ficou, coitado, com o tronco cheio das feridas inflingidas pela lâmina dos “dozer“. No seu tronco mandei colocar uma mensagem para o inimigo, escrita na tampa da caixa de uma ração de combate, que se rendessem à engenharia que era tropa amiga e de confiança.

 

E continuou-se o trabalho rotineiro mas poeirento, sob um sol escaldante e sempre sob a ameaça deles e de um ataque de...abelhas que tudo e todos paralizava. 
Havia dias em que não conseguíamos progredir mais do que quinhentos metros, tal era a densidade da floresta e a robustez das árvores, e isto para desespero dos chefes instalados em Nampula, desconhecedores da realidade daquele mato.
Um dia, recebi via rádio uma ríspida ordem para avançar mais depressa. Era considerado que estávamos a ser lentos. 
Os “crânios” da guerra consideravam-nos turistas passeando naquele lindo matagal no meio de musicais e surpreendentes emboscadas, recebendo, dia-sim, dia-não, gostosa e típica morteirada. 
Ora m...
Respondi de imediato e, no meio de profusos Vexas e de respeitosamente, dizia que iria obedecer de imediato, mas que solicitava respeitosamente que aquela aparente alteração da ordem de operações fosse confirmada pela mesma via, evitando as consequências de um mal-entendido da minha parte. Na eventualidade de uma mudança de planos, se não fossem feitos o alargamento do itinerário e a desmatação de vinte metros, a engenharia chegaria a Omar no dia seguinte, garantia eu. 
Não recebi resposta e não voltaram a chatear.
No regresso de Omar, dificil e perigoso porque eles sabiam exactamente por onde iríamos passar, chegámos à “minha” rotunda, mas do embondeiro nada. 
Só um largo cepo com um cartão espetado no topo. 
A enorme árvore tinha sido laboriosamente cortada à catana e no verso da tampa de cartão que lá tinha deixado li a resposta à minha mensagem e que era mais ou menos esta: 
“O que a força bruta das máquinas imperialistas não foi capaz conseguiu a força do povo oprimido.“

quinta-feira, 14 de março de 2013

O Papa Francisco



Ontem, dia 13 de Março, um colégio de cardeais, ao fim de apenas o segundo dia do
Conclave, elegeu o 266º Papa da igreja católica. Assisti ao facto pela televisão.
Não sou católico mas a atitude do novo Papa impressionou-me muito. 
Quiz conhecer mais factos da sua vida e por este meio pretendo transmitir alguns, na esperança de quem os ler concorde com a minha impressão: o novo Papa é uma personagem invulgar na igreja católica.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_Francisco; http://www.tribunahoje.com/noticia/57687/mundo/2013/03/13/papa-francisco-i-e-engenheiro-quimico-e-so-tem-um-pulmo.html

Tendo nascido em 1936, licenciou-se não em filosofia, nem em teologia ,mas em engenharia
química pela Universidade de Buenos Aires. Por esta universidade obteve o grau de mestre e
só abandonou a sua profissão de engenheiro químico por motivos de grave doença nos finais
da década de 50. 
Em 1958 ingressou na Companhia de Jesus e foi ordenado sacerdote em 1969. Exerceu
funções académicas de relevo na  Faculdade de Filosofia e Teologia de San Miguel.
Doutorou-se na Alemanha. O Papa João Paulo II nomeou-o em 1992 bispo auxiliar de Buenos
Aires e em 1998 era seu arcebispo. Tornou-se cardeal em 2001. 
A sua atitude durante o regime ditatorial argentino de 1976-1982 é hoje objecto de polémica
sendo, também, recordada a sua frontal oposição ao governo de Cristina Kirchner quando
este apoiou a lei relativa ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.
"Não vamos ser ingénuos: não se trata de uma simples luta política; é uma tentativa de destruição do plano de Deus", escreveu ele ao Congresso. 
Seja como for, não se deve esquecer a sua proximidade e a sua solidariedade efectiva para com os pobres do seu país natal. 
O Papa Francisco é sul-americano, é jesuíta e adoptou o nome de Francisco. 
Um Papa não europeu, não oriundo de qualquer país ou continente com pretensões hegemónicas ou disputado pelo Islão. É franciscano por coração e um factor de esperança, como o foi João XXIII com o concílio Vaticano II. 
Ser sul-americano é estar longe das intrigas e interesses da cúria romana, é constituir um garante de um “um novo rosto” para a igreja de Roma como a isso apelou o cardeal português D.José Policarpo. 
Ser jesuíta (ordem religiosa intelectual por excelência) é garantia de ortodoxia para quem na
cúria se possa opor a qualquer transformação que ponha em causa a primazia da Roma católica e é qualidade que a alguns lembra, talvez injusta e erradamente, a Inquisição.
Inquisição que, desde o século XII e confiada aos dominicanos, preencheu as páginas mais negras da igreja católica e cujo nome sofreu várias alterações ao longo da história até ficar com o de “Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé”, com Paulo VI. 
Lembro-me, como exemplo de arrogância desta congregação, que em tempos recentes um Papa, muito louvado e admirado, ter tido a presunção de reabilitar Galileu condenado pela Inquisição. 
Como se ele, Papa, fosse um científico, um Newton, um Descartes, contemporâneos de Galileu, ou um Einstein, génio contemporâneo. Deveria, sim, ter pedido desculpa em nome da igreja, como esta fez relativamente aos judeus. 
Ter escolhido o nome Francisco, de Francisco de Assis - crítico da Igreja de Roma no tempo de
Urbano III (1209) e que tinha como ideais a pobreza, a humildade e a simplicidade -  é
desejo que a igreja de Roma siga aqueles princípios da ordem franciscana, esquecidos
durante os últimos 800 anos. 
A atitude e as primeiras palavras de ontem do Papa Francisco são um fiel exemplo de como, nas coisas mais simples e, simultaneamente, mais grandiosas, aquelas regras franciscanas podem e deveriam ser seguidas pela igreja católica.
Confesso, para eventual escândalo de alguns, que gosto de ver como novo chefe da igreja
católica é um ex-engenheiro (como eu), um amador de tango (como eu) e um atento espectador
de futebol (como o é o povo português a que pertenço).


segunda-feira, 4 de março de 2013

O alargamento do Canal do Panamá

Deslocou-se recentemente ao Panamá uma missão empresarial portuguesa sob a chefia de um Secretário Adjunto da Economia. 
Segundo este e de acordo com o publicado na imprensa,  “a abertura do Canal do Panamá em 2014 abrirá portas de grande oportunidade à economia portuguesa”. Como se verificará adiante não se trata da abertura de um canal o qual se encontra naquela situação de aberto desde Agosto de 1914, vai fazer 100 anos. Trata-se das consequências do seu alargamento.
É uma iniciativa que se encontra, julgo, enquadrada no âmbito da denominada “política económica”. Não podendo a nossa economia crescer significativamente “por dentro” --- destruída quando da entrada no euro, quando alguém (academicamente qualificado) se orgulhava de proclamar ex-cátedra sermos os bons alunos da Europa e, a troco de dinheiro, ter mandado, ou incentivado, abandonar a agricultura, desprezar a pesca, destruir, pela sua venda ao estrangeiro, a pequena e média indústria) -- que se procure, então, “lá fora”. 
No Japão e na China, de que é recente exemplo a apresentação das férteis terras do Alentejo a entidades daquele país, ou no Reino Unido com a “oferta” de imobiliário no Algarve ou, ainda, em Marrocos nos sectores da construção civil.
No Panamá? Porque não?
"...a criação no futuro de um espaço económico exclusivo entre a Europa e os Estados Unidos da América reforça a importância estratégica das rotas marítimas entre o Panamá e Portugal", segundo o mesmo governante.
Mas que é isso do “alargamento”? O que é o “Canal do Panamá”?


Caminhos marítimos para o Índico e para o Pacífico
Foram vários os navegadores (todos portugueses) que procuraram a passagem entre o oceano Atlântico e os oceanos Índico e Pacífico.
Em Julho de 1497, Vasco da Gama (vassalo de D. Manuel I de Portugal) partiu de Lisboa com quatro naus e cento e setenta homens e chegou a Calecute em Maio de 1498. Foi a mais longa viagem oceânica (do Atlântico ao Índico) até então realizada.

                                
Em 1520, Fernão de Magalhães (ao serviço de Carlos V de Espanha) descobriu no extremo sul do continente americano um estreito, depois baptizado com o seu nome, que ligava o Atlântico ao Pacífico. 
A partir dessa data, para ligar por via marítima os dois lados do continente tinha-se que rodeá-lo pelo sul numa viagem que durava meses. 
A título de comparação, a distância pelo Cabo Horn entre Nova York e São Francisco é de 22.500 kilómetros, ao passo que pelo canal do Panamá é de 9.500 kilómetros. 
Hoje em dia, a travessia do Canal dura 8 a 9 horas, em vez dos meses pelo estreito de Magalhães.

Ferdinand Lesseps, o construtor do canal de Suez obteve em 1878 uma concessão da Colômbia que autorizava a sua companhia a iniciar as obras. Lesseps insistia num canal ao nível do mar, mas nunca encontrou solução para o problema causado pelo rio Chagres que, atravessando diversas vezes a linha do canal, implicava uma drenagem total do rio.
As obras começaram em 1880.


No entanto, a diferença entre escavar areia numa área seca e plana (Suez) e remover enormes quantidades de terreno no meio de uma floresta tropical, era enorme. 
Enchentes, desmoronamentos e altas taxas de mortalidade por doenças tropicais, nomeadamente a febre amarela, forçaram os franceses a abandonar o projecto. 
Em 1885, o plano inicial de um canal ao nível do mar foi alterado de modo a incluir uma comporta. Mas, após quatro anos de actividade, a companhia de Lesseps faliu.

O projecto foi, então, retomado pelos norte-americanos, ainda o Panamá fazia parte da Colômbia. 

(O Panamá acabou por proclamar a sua independência em 3 de Novembro de 1903 e permitiu, em 1904 pelo tratado de Hay-Bunau-Varilla,  o controlo (para sempre) dos Estados Unidos sobre 5 milhas para cada lado do canal, em troca de 10 milhões de USD e de uma renda anual, a partir de 1913, de 250.000 USD. Em 1977, durante a administração Cárter, o tratado foi revisto e o Panamá passou a controlar o canal desde de 31 de Dezembro de 1999). 

O plano norte-americano para o canal era totalmente diferente do de Lesseps.
Foi adoptado um sistema de eclusas e controlado o rio o Chagres através de um imenso aterro, formando uma barragem em Gatún. 
O lago artificial resultante, com 33 km de comprimento, 425 km2 de área e 5,2 km3 de  volume de água, não só fornece a água e a energia hidroeléctrica para a manobra das eclusas, como também constitui uma "ponte de água" que cobre um terço do total da extensão do atravessamento.
As dificuldades de uma obra de tal dimensão, cuja construção durou dez anos, foram levadas a bom termo e a sua conclusão ocorreu em 10 de Outubro de 1913 entrando efuncionamento a 15 de Agosto de 1914. 
Actualmente, atravessam por ano mais de 14000 embarcações que pagam 1 USD por tonelada de carga, contribuindo para 25% da riqueza do Panamá.

                                    
O Canal do Panamá tem um comprimento total de 82 km, uma largura mínima de 90 metros e uma profundidade também mínima de 12,5 metros.
O Canal sobe do Atlântico até ao lago de Gatún (alimentado pelo rio Chagres e que fica 26 m acima do nivel do mar) através de três eclusas (com 21 m de altura e 745 toneladas de peso, mas que requerem para a sua manobra um motor de apenas 30 kW)  às quais se seguem as eclusas de Pedro Miguel, que fazendo descer os barcos de 9,5 m os conduzem ao lago Miraflores (a uma cota inferior e a 16,5 m acima do nivel do mar).
O canal desce depois em direcção ao Pacífico pelas duas eclusas de Miraflores com 16,5 m de altura.
Todas as eclusas do canal são duplas, de modo que os barcos possam passar nas duas direcções, têm 305 metros de comprimento e 33 metros de largura e nelas os barcos são puxados por pequenos combóios.


A aprovação, por referendo realizado em outubro de 2006, do projecto de ampliação do canal conduzirá a uma das maiores obras de infraestruturas do mundo. 
As obras, cuja conclusão está prevista para 2014/2015, terão o envolvimento de 8.000 trabalhadores e, segundo as estimativas do FMI, um custo mínimo de 5000 milhões de USD.
As razões para esta ampliação residem na saturação da actual capacidade de trânsito do canal, nas dimensões das três actuais comportas que limitam o tamanho dos barcos a 32,3 metros de largura e a 294m de comprimento e na tonelagem dos navios que podem atravessar o Canal que não pode exceder 65.000 toneladas de carga, quando a actual tendência da indústria naval é a de construir barcos de maior capacidade que pode atingir as 300.000 toneladas. 
Este problema do aumento crescente da tonelagem levantou a hipótese da construção de um novo canal, tendo sido analisados três traçados alternativos, pela Colômbia, pelo México e pela Nicarágua, permitindo, os dois primeiros, soluções ao nível do mar, em alternativa ao traçado do Panamá que exige uma solução de eclusas.
Um novo traçado fora do Panamá, que traria para este graves consequências económicas e sociais, foi abandonado.
Os estudos de impacte ambiental revestiram-se de particular importância, tendo em atenção a desflorestação e o acréscimo no consumo de água resultantes da obra (cada barco que utiliza o canal consome cerca de 200 milhões de litros de água, podendo o tráfego no Canal atingir 40 barcos por dia), com consequências no caudal do rio Chagres e no lago artificial de Gatún, que constitui uma das principais reservas mundiais de água doce.
O projecto final resultou de mais de 140 estudos de soluções alternativas e de viabilidade que duraram mais de cinco anos.

Elementos de consulta: 

        





                                                                                     

                                                          

domingo, 3 de março de 2013

Bento XVI e Gregório XII - Duas resignações

                                              Os papas de Avinhão e de Roma (1378-1417)    


À morte de Gregório XI (papa de 30 de Dezembro de 1370 a 27 de Março de 1378, de naturalidade francesa e com residência em Avinhão), o Conclave, reunido sob fortes e violentas pressões populares contra o predomínio dos legados franceses e reclamando um papa romano ou, pelo menos, italiano, elegeu o arcebispo de Bari, Bartolomeu Prignani sob o nome de Urbano VI

                                                                    St.ª Catarina e Gregório XI

                                                     A Europa estave em guerra, a Igreja também.

                      
                                                  O Papa Urbano VI assediado no castelo de Nocera

As dúvidas quanto à legalidade da eleição e discutíveis nomeações cardinalícias, que reduziam a representação francesa no Sacro-Colégio, conduziram à revolta de treze cardeais franceses que declararam anticanónica a eleição de Urbano VI e elegeram como papa o cardeal Roberto de Genebra, o qual tomou o nome de Clemente VII. 
Era o “Grande Cisma do Ocidente” que durou mais de 52 anos e só terminou com as decisões tomadas no Concílio de Constança (1414 -1418).

                                                      Urbano VI                                   Clemente VII

Os cardeais partidários de Clemente (que se instalou em Avinhão) visitaram os diversos reinos cristãos defendendo a sua legitimidade. 
Conseguiram-no com Carlos V de França acompanhado pelas casas reinantes das nações suas aliadas, nomeadamente pela Espanha (Henrique II de Trastâmara) e pela Escócia.
A Itália, o Império, as nações escandinavas, a Hungria e a Inglaterra (Edward III), apoiaram Urbano VI, tal como Portugal desde D. Fernando. 

(” D. Lourenço, arcebispo de Braga e 86º primaz das Espanhas, apresentou-se à frente do exército de D. João com armadura completa e, trazendo uma cruz alçada, abençoou os combatentes, prometendo absolvição em nome de Urbano VI, a todos os que combatessem contra os cismáticos castelhanos, partidários do anti-papa Clemente VII (...)  após as acções de bom pastor, passou o arcebispo às de bom cavaleiro....morreu na batalha (Aljubarrota) e foi sepultado na Sé de Braga em 1397; o seu actual monumento é do ano de 1663 e foi erigido por um dos seus sucessores..nunca se pôde saber com certeza o nome da família deste célebre príncipe da Igreja” ). ~

Em Avinhão, a Clemente VII sucederam Benedito XIII, Clemente VIII, Benedito XIV.
Em Roma, a Urbano VI (1378-1389) sucederam Bonifácio IX (1389-1404), Inocêncio VII (1404-1406), Gregório XII (1406-1415).

Era uma situação que não se podia manter e, após a recusa de Gregório XII em encontrar-se com Benedito XIII, as discussões conduzidas pela Universidade de Paris concluíram pela deposição de ambos os papas por um Concílio.
Assim, no Concílio de Pisa em 1409, foram declarados depostos os papas de Roma e de Avinhão. No seu lugar foi eleito um cardeal grego que tomou o nome de Alexandre V.
À sua morte, passado apenas um ano, o seu colégio cardinalício elegeu o papa que se designou como João XXIII.



Ficavam assim estabelecidas não duas, mas três obediências, que nem as negociações, nem as
pressões política e religiosa conseguiam desfazer.
Finalmente, por iniciativa do Imperador Segismundo e do “antipapa” João XXIII, foi convocado o Concílio de Constança (1418-1419), com o apoio de Gregório XII (Roma) e a oposição de Benedito XIII (Avinhão). Este Concílio revelou-se um acontecimento único na história da Igreja, porque, na ausência de um papa indiscutível, foi dirigido pelos príncipes cristãos (nomeadamente pelo Imperador) e assim se criou um precedente importante, o do poder do Concílio, abrindo caminho à discussão sobre a supremacia do poder papal.
Gregório XII abdicou, João XXIII foi deposto tendo ficado cardeal e Benedito XIII refugiou-se na sua fortaleza aragonesa, recusando abdicar e criando com elementos da sua família uma cúria que nomeou os seus dois sucessores.
Foi eleito e reconhecido por toda a cristandade o cardeal romano Oddone Colonna que tomou o nome de Martinho V (1417-1431).


                                                      Eleição de MartinhoV. "Habemus Papam"