Hoje foi noticiado que o
presidente da Câmara Municipal de Borba, tinha conhecimento desde 2004 da falta
de segurança da estrada, como é comprovado numa acta da Assembleia Municipal de
2014.
Assisti às declarações
do Sr. Anselmo na conferência de imprensa realizada logo a seguir da
catástrofe. A sua atitude, a sua quase violenta negação de um conhecimento
prévio, a sua declaração de assumir toda e qualquer responsabilidade,
impressionaram-me.
Como a memória dos
responsáveis é curta mesmo para o que é recente, lembre-se o trágico colapso em
2001 da ponte Hintze Ribeiro que ligava Castelo de Paiva a Entre-os-Rios e que
matou 59 pessoas. Lembre-se o enorme incêndio que assolou o distrito de Leiria
em 2017. Foi o maior e mais mortífero incêndio florestal no país desde 1900 e o
11º a nível mundial, com 67 mortos e 254 feridos.
Duas tragédias de
naturezas diferentes mas com causas semelhantes que merecem algumas observações.
A primeira e a mais
evidente foi, em Entre-os-Rios, o louvável e imediato pedido de demissão do
ministro do Equipamento Social responsável pelas condições de segurança daquela
obra do Estado. No caso de Pedrógão, os ministros responsáveis ficaram nos seus lugares impávidos ou chorosos só sendo substituídos tempos depois
no âmbito de uma remodelação governamental.
A segunda observação, consiste
na semelhança das causas das tragédias: negligência e incompetência. Voltaram a
ocorrer na recente tragédia da EN 255 entre Borba e Vila Viçosa.
Será que somos, como já
no tempo dos romanos se afirmava, um povo que não se sabe governar e que não se
deixa governar? Será que somos, como muitos diletantemente afirmam, um povo sem
técnicas apuradas e sem regulamentação adequada? Ou será que a deficiente educação,
o proveito-próprio e os diversos interesses se apoderaram deste pobre país?
Sempre tive a convicção
que, contrariamente ao adágio romano, o povo português reúne as qualidades
necessárias para ser bem governado mas que as más elites florescem como as
pragas que não são evitadas ou combatidas a tempo. Leia-se a História de
Portugal.
Falta de Técnica? Para
não referir “pequenas” invenções como o astrolábio náutico no século XV (Abraão
Zacuto para D. João II) e o nónio no século XVI (Pedro Nunes), Portugal
revolucionou a arte de navegar e as suas descobertas “não se fezeram indo a acertar”, resultaram de estudos e de metódicas
pesquisas.
Regulamentação? Depois
to sismo de 1755, Portugal criou o mais moderno regulamento de construção e no
domínio das estruturas tinha, reconhecidamente e até à publicação dos
Eurocódigos, as mais avançadas normas a nível mundial.
A tragédia da derrocada
da estrada de Borba é paradigmática.
Como é possível ignorar a
inconcebível barbaridade de uma estrada com um troço da ordem dos 100 m com
bermas distantes escassos 5 m de duas enormes crateras de mármore escavado
(quando o mínimo legal é de 50m), com paredes na vertical e com alturas de 90m
e de 80 m? Quem autorizou? Como é possível uma via de circulação cuja falta de
segurança era conhecida há mais de 10 anos ser utilizada por autocarros de
turismo, por transportes escolares e pelos moradores da região? Como é possível
que as autoridades responsáveis pela segurança dos cidadãos não tenham
interdito aquela estrada? Como é possível que tão escandalosa situação não seja
objecto de contundente comentário de ministros e do presidente da república os quais
apenas sublinham a prioridade de garantir a segurança das operações de resgate?
Se existe Técnica
competente e Regulamentação adequada, onde reside, então, a causa de tragédias
materiais e humanas resultantes de colapsos estruturais e de incêndios florestais?
Tudo aponta para negligência, irresponsabilidade, incompetência, interesses de
vária ordem e na total falência dos serviços públicos.
Depois, na prática, a
justiça não funciona: investiga-se muito, demoradamente, mas não se apuram
concisas e claras responsabilidades que são sempre demasiado dispersas.
O pior é que há por aí muita
obra a qual, em termos de segurança, mereceria das entidades responsáveis
imediata atenção e competente intervenção. Mas não, vai ficar quase tudo na
mesma.
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