quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

D. Sancho II e o capelo azarento



“O Capelo” (porque o usava quando criança). Ingénuo na política, no casamento, na solidariedade fraternal. Em tudo menos na “Reconquista”.

 
Sempre tive simpatia por este rei e muito pouca pelo seu irmão Afonso (o futuro Afonso III).
É um sentimento que não é racional, mas a vida não é só feita de razão.
Um foi um valente mas fraco rei e o outro um calculista mas um muito bom rei. Um debateu-se com uma crise profunda interna (nobreza) e externa (Igreja), com a inimizade dos poderosos e o outro, rompendo com compromissos e traindo confiança e solidariedades juradas abandonou a sua primeira mulher Matilde e “roubou” o reino ao irmão (o mesmo tendo acontecido, em circunstâncias muito diferentes é certo, quatro séculos depois com Pedro II e Afonso VI).
Afonso actuou da forma necessária para obter o reino abdicando do título de conde “jure uxoris” (por direito de sua mulher) de Bolonha e divorciando-se de Matilde condessa de Bolonha.
O futuro Afonso III teve que esperar até à morte de Sancho II para se denominar rei. Até lá era “visitador”, “curador”, ” defensor” do reino.Teve que mudar de bandeira porque não podia utilizar a do seu pai Afonso II, pertença do seu irmão mais velho e casou em segundas núpcias com Beatriz de Castela (filha do rei Afonso X) e daí os castelos nas suas armas que depois perduraram nas armas de Portugal.
Onde está sepultado esse nosso rei, esse rei de Portugal, neto de Leonor de Inglaterra (irmã de Ricardo “coração de leão”), bisneto de Leonor de Aquitânea e de Henrique II de Inglaterra?
Morreu exilado em Toledo, mas onde está a sua sepultura?
Que diligências fizeram os poderes portugueses desde 1248 até hoje para trazerem para a sua terra esse nosso rei? Que seja do meu conhecimento, apenas com Salazar foi enviada uma comissão científica a Toledo para averiguar sobre o paradeiro da sua sepultura. Nada foi descoberto e tudo ficou na mesma. É circunstância triste para um povo que se pode orgulhar da sua longa, muito antiga e nobre história.
D. Sancho II, quarto rei de Portugal e filho de D. Afonso II e de D. Urraca de Castela, nasceu em Coimbra em 1209 e subiu ao trono em 1233.
Nesse tempo Portugal encontrava-se em conflito diplomático com a Igreja decorrente da acção de Afonso II para reduzir o seu poder. Afonso II foi excomungado pelo papa Honório III, como, aliás, já acontecera com o seu pai D. Sancho II e aconteceria posteriormente com os seus filhos Sancho (o “hereje”) e Afonso (o futuro D. Afonso III).
D. Sancho II, cuja prioridade era a “Reconquista”, revelou ser um bravo chefe militar, conquistando várias cidades no Algarve e no Alentejo mas, pelo seu  descuido nas tarefas administrativas, facilitou e criou conflitos com a nobreza (substituindo os conselheiros da corte pelos seus companheiros de armas) e, sobretudo, com a Igreja. Na sequência de uma disputa com o bispo do Porto, este queixou-se ao Papa Inocêncio IV o qual, no concílio de Lyon, excomungou e depôs Sancho II  ordenando (!) aos portugueses que escolhessem um novo rei (para substituir o "hereje").
Em 1246, o irmão mais novo de Sancho, Afonso, casado com a condessa Matilde de Bolonha, foi convidado a ocupar o trono. Numa assembleia de prelados e nobres portugueses, reunida em Paris, Afonso jurou guardar todo os privilégios, nomeadamente os  dos municípios, do clero e da nobreza.  Abdicou do seu título e das suas terras e marchou sobre Portugal. D. Sancho II fez-lhe frente com sucesso mas  a pressão da Santa Sé levou à sua abdicação em 1247 e ao seu exílio em Toledo onde morreu em 1248.
Não foi no campo militar que D. Sancho II (que chegou a pedir o auxílio do seu irmão Afonso!) foi derrotado, foi a pressão da Santa Sé (em Lyon, em Paris) que levou Sancho II a abdicar em 1247 e a exilar-se em Toledo onde morreu em 1248.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

O homem e o clima de amanhã.

Há quase 20 anos que nas Nações Unidas é debatida a questão do aquecimento global provocado pelas emissões de gases com efeito de estufa (GEE): as emissões de CO2 resultantes da utilização dos combustíveis fósseis (mais de 80% do total) e as emissões de metano e do protóxido de azoto. 
Para além dos GEE também é muito significativa, para o aquecimento global do planeta, a enorme desflorestação levada a efeito pelo homem.
As atenções estão agora centradas na COP 21 que está a decorrer em Paris, com múltiplas opções que deverão ser objecto de decisão dos países participantes até ao final da Conferência em 11 de Dezembro (2015).
Note-se que as alterações climáticas são um processo lento, progressivo e, em certa medida, irreversíveis: o que hoje for feito só será significativo daqui a duas gerações e não remediará o mal do passado. Reduzir as emissões de CO2, em nunca menos de 2ºC, tem como medida fundamental e incontornável uma transferência para outras fontes de energia, em particular as energias renováveis e a energia nuclear. Esta transferência tem custos e levanta interrogações económicas baseadas no parâmetro “custo-benefício”, o que é, de facto, a questão central porque o custo é certo e de curto prazo e o benefício é incerto e sempre de longo prazo.
Em termos económicos, pode afirmar-se que o investimento de um processo de alteração para aquelas fontes de energia, menos poluentes e com maior eficácia, será tanto menor quanto maior forem as taxas de juro de hoje e mais distante o horizonte temporal da meta a atingir.
O homem-económico, o homem-político, embora tenha a consciência de ter arruinado a natureza do nosso planeta, tal como a conheceram e usufruiram os nossos avós, afirma, por pura conveniência, que sem nada ser feito a natureza se adaptará às barbaridades por ele praticadas e que o futuro sendo certamente diferente não será tão catastrófico como o homem-cientista alerta e comprova. 
Tudo começou em 1988 (há quase 30 anos) na Conferência de Toronto, seguida da Conferência da ONU Eco-92 no Rio de Janeiro. Era proposto que os pses-membros tivessem a obrigação de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em pelo menos 5,2% em relação aos níveis de 1990 e no período de 2008 a 2012. Para que esse protocolo entrasse em vigor era necessária a sua ratificação por 55 países que juntos produzissem 55% das emissões (continua a ser a condição legal imperativa).
Seguiu-se, então, em 1997 o Protocolo de Quioto que só entrou em vigor 8 anos mais tarde, em 16 de Fevereiro de 2005, após a Rússia o ter ratificado em 2004. 
Se tivesse sido então implementado, a temperatura do globo ter-se-ia reduzido de 1,4ºC a 5,8ºC até 2100, valores mesmo assim contestados como insuficientes pela comunidade científica.
Os EUA (segundo maior emissor de GEE) negaram-se a ratificar o Protocolo,  algumas nações europeias admitiram então que não conseguiriam atingir as metas do Protocolo e que a redução dos GEE seria em 2010 apenas de 1%  e 9 dos 15 países europeus signatários do Protocolo viram as suas emissões aumentar entre 20% e 70% (!).
O Protocolo expirou em 2012 e aqui estamos com o Mundo cada vez mais à beira de uma catástrofe ecológica nos próximos 50 anos se não antes. Os sinais aí estão, entre outros o degelo nos polos, inundações, tempestades e secas extremas, como é o caso do Lago do Tchad que já foi o maior lago de África e que hoje ocupa um área inferior a 10% da sua área em 1960 (23.000 km2 em 1963, 4.000 km2 em 2001, 2.500 km2 em 2008). https://pt.wikipedia.org/wiki/Lago_Chade
No passado dia 12 de Dezembro foram publicados os termos do acordo da Cimeira de Paris. É um texto em inglês com 31 páginas que incluem os 29 artigos do Acordo propriamente dito.

No seu Artigo 1 é declarado “Suster o aumento da temperatura média global bem abaixo de 2ºC acima dos níveis pré-industriais e continuar os esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais, reconhecendo que tal reduziria significativamente os riscos e impactos da mudança climática”.
Foi muito e sorridentemente aplaudido.
“Continuar os esforços”? Quais? O “acordo” continua a ser imperativo só se 50% dos países que etc...
Enfim, veremos se, mais uma vez, os interesses políticos e económicos não se irão sobrepor às exigências científicas as quais se desenvolvem apenas pela preocupação do equilíbrio climático do planeta e, portanto, com o bem-estar do homem que nele habita.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

A Nova Guerra.


Começou. 
Os acontecimentos sangrentos do passado muito recente que incluem terrorismo e assassinatos, abates de aviões civil e militar russos, matança em Paris, tiroteios mortíferos nos EU, assassínios na Grã Bretanha, Tunísia e Mali, estados de emergência e cancelamento de eventos públicos na Bélgica e na Alemanha são sinais. Sinais da impotência de nações politica e militarmente poderosas, sinais de perigoso antagonismo entre potências. Sinais de guerra.
A extrema violência que recentemente deflagrou é diferente da ocorrida no passado. Para além de uma raíz religiosa, como ocorreu na Europa no século XVI com a reforma protestante e mais recentemente com a questão irlandesa, e para além de um problema nacionalista como o do país basco ou de um terrorismo político como o das brigadas vermelhas e dos extremistas palestinianos, a violência de hoje é muito próxima da de uma guerra, sobretudo no sofisticado armamento, no profissionalismo, na logística, no planeamento. 
O Médio-Oriente foi desmantelado por pressões externas de que a invasão do Iraque e a chamada “Primavera Árabe” são exemplos. Porquê impor a todos os povos e a todas as culturas regimes políticos que são próprios apenas dos povos e das culturas ocidentais?: pelos enormes ganhos financeiros no monopólio do comércio das matérias primas em geral e do petróleo muito em particular.
Vive-se um mundo violento e perturbado, desde o Kurdistão ao Iemen. O Ocidente assiste impávido ao colapso de estados e apoia a desorganização territorial daquela zona. 
No passado mês de Outubro, a Alemanha anunciou que iria ter um papel mais activo no combate aos jihaditas. Aviões, navios de guerra e 1200 militares irão intervir na Síria. Também, muito recentemente, a Câmara dos Comuns do Reino Unido aprovou a intervenção da Força Aérea na Síria. Ocorreram, então, em Londres manifestações contra esta intervenção lembrando-se os fracassos no Iraque e no Afganistão.
O Ocidente não aprendeu com a experiência recente: os bombardeamentos aéreos não resolveram nada, provocando milhares de vítimas civis e acirrando o ódio contra o Ocidente.
A barbárie ocorrida em Paris mudou tudo. A Europa está em guerra a qual, no entanto, é de muito difícil combate só será ganho a longo prazo com a destruição das fontes de financiamento e de armamento do Daesh ** e com tropas árabes no terreno, nomeadamente da sunita Arábia Saudita apoiada pelo Ocidente. Arábia Saudita mãe do fanatismo religioso, mãe do Al Qaeda de ontem e do Daesh de hoje.
Ocorrerão mais guerras limitadas com assassínios, terror e subversão que constituem a nova guerra que o presidente Hollande anunciou numa 6ª Feira 13.
** A Amnistia Internacional identificou recentemente a natureza e as fontes de fornecimento do armamento do DAESH. São mais de cem os tipos de armamento provenientes de mais de 25 países. As forças armadas do Iraque são um dos principais fornecedores, quer directa quer indirectamente como aconteceu com a conquista de Mossul.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

O feriado do 1º de Dezembro



À data, são 9 os feriados nacionais, 5 religiosos e 4 civis:
Sexta-Feira Santa, Páscoa, Assunção de N.Sr.ª, Dia da Imaculada Conceição, Natal, Ano Novo, 25 de Abril, Dia do Trabalhador, Dia de Portugal.
Em 2012 o governo (hoje demitido) aboliu 4 feriados, dois religiosos e dois civis: Dia do Corpo de Deus, Dia de Todos os Santos, Dia da Implantação da República e Dia da Restauração da Independência.
O actual governo (com maioria parlamentar) irá, segundo tudo indica, repor os dois feriados civis e negociar com a Igreja os feriados religiosos. A influência na produtividade dos feriados anulados revelou-se nula. Portugal, contrariamente à voz comum, é um dos estados europeus com menos feriados mas, de acordo com declarações do passado de um responsável do ex-governo, o mais liberal de todos...
Foi a República que logo em 1910 instaurou o Dia da Restauração como feriado nacional, sublinhando o seu carácter patriótico. Em Portugal houve muito poucos políticos republicanos partidários de uma união entre Portugal e Espanha, contrariamente ao que ocorria nesse tempo em Espanha. Pudera…
Este facto não invalida outro facto: os inimigos declarados da casa real portuguesa (a de Bragança) e da monarquia instauraram em 1910, como feriado a data em que aquela mesma casa chefiou uma Revolução Nacional para a independência de Portugal: 1 de Dezembro de 1640.
Os dias 5 de Outubro e 1 de Dezembro estão, deste curioso e antagónico modo, indissociavelmente ligados.
O dia 1º de Dezembro foi um Golpe de Estado que iniciou a Guerra da Restauração (cujo monumento comemorativo marca a Praça dos Restauradores em Lisboa).
A guerra durou 28 anos.
Terminou em 1668 com a assinatura do Tratado de Lisboa, assinado por Afonso VI de Portugal e Carlos II de Espanha, pelo qual era reconhecida a independência de Portugal.
A morte do cardeal - rei D.Henrique de Portugal em 1580 provocou uma crise dinástica na qual os principais pretendentes foram os netos do rei D. Manuel I: D. António Prior do Crato filho bastardo do infante D.Luís, Filipe II de Espanha filho da Infanta D. Isabel, e D. Catarina de Bragança filha do infante D. Duarte.Os dois primos entraram em guerra e as forças portuguesas foram derrotadas pelo exército castelhano comandado pelo Duque de Alba na batalha de Alcântara em Lisboa. A guerra continuou nos Açores até 1583 onde D. António e os seus partidários se tinham refugiado. 


Filipe II de Espanha e primeiro de Portugal jurou, nas cortes de Tomar de 1581, manter todas as leis portuguesas, respeitar as liberdades sendo a administração do reino mantida por portugueses, nomeadamente o cargo de Vice-Rei e todos os outros previstos na corte portuguesa. O comércio da Índia e da Guiné só podia ser feito por portugueses.
Cumpriu.
Dois reinos e um só rei.
No início do reinado de Filipe IV de Espanha, o tratado foi anulado pela mão do conde- duque de Olivares. A autonomia portuguesa foi anulada e Portugal passou a ser apenas mais uma província espanhola, como a Catalunha que nessa altura também se revoltou. Foi o rastilho da Guerra da Restauração que tinha na sua base uma muito elevada carga fiscal (Espanha debatia-se com graves problemas financeiros) contestada pela burguesia a qual tinha o apoio da nobreza portuguesa que tinha sido substituída pela espanhola nos assuntos internos do até então reino de Portugal.  
Filipe IV rompeu o juramento feito por Filipe I nas cortes de Tomar.
Um descendente de Catarina de Bragança, D. João duque de Bragança, aceitou, com grande relutância, chefiar os revoltosos. De certo modo, passados 60 anos, a História repetiu-se.
Desta vez, Portugal venceu libertando-se para sempre da tutela castelhana.

Dizem que hoje muitos catalães nos invejam, mas a população de Olivença - anexada pela Espanha mau grado o estabelecido pelo Congresso de Viena em 1815 – não tem inveja e deseja manter-se espanhola, tal como os gibraltinos querem continuar a ser cidadãos britânicos.