sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

A PDI.


Estou lá, com grande desgosto e desânimo. Por causa da idade.
A P…da idade é uma triste realidade que nenhum decreto governamental poderá alterar.
Traz com ela inesperadas doenças (as p…) próprias da idade (“avançada”). Mas, dizem-me os jovens (que muito mais tarde, não repetirão o discurso) que a muita idade é o ponto alto do ser humano, em experiência e, nomeadamente, em sabedoria. Ora, sendo talvez evidente, tal experiência tem, no fundo, pouca adesão à realidade da expectativa humana.

      
                       


Experiência tem-se ao fim de muitos anos, quer se queira quer não: boa ou má, útil ou descartável, saudosa ou de pesadelo, frágil, que até se esquece, ou forte porque sempre presente.
E “ós pois”? Eu, se pudesse trocava tudo aquilo por ter menos 10, menos 30, menos 50 anos. Teria a experiência própria da idade e uma sabedoria (boa ou má) que, na realidade e conforme às leis da vida, cresceria comigo na alegria e na tristeza, no sucesso e na derrota.
Troco, sem hesitar, a sabedoria pela juventude, porque uma cresceria comigo e a outra desapareceria com o tempo. Claro que sim! A procura do milagroso elixir da vida, que sempre foi esperança humana e o sucesso da medicina e das técnicas de hoje, no prolongamento da vida com o retardar da velhice, são provas disso.

   
Antes morria-se aos 40-e-tais anos, hoje aos 70-e-tais-anos, amanhã aos 120, dizem. 
Antes, saltava da cama num ápice, corria pelas ruas em fato de treino depois de regressar cansado do trabalho, nadava aos fins-de-semana (mal mas melhor do que o Alto Chefe), dormia como um anjo, comia e bebia o que bem me apetecia, não tomava remédios, nada no corpo era sinal de qualquer mal.
Era jovem com a sabedoria própria do passado, saudável.
Hoje? Uma desgraça, a dificuldade em saír de qualquer posição, a falta de fôlego num passo mais apressado, um inesperado e constante esquecimento (de tudo e de nada), uma dieta para isto e para aquilo, uma dúzia de pílulas para isto e para aquilo.

    
       

Tudo atinje a negação do bem da sabedoria a qual, ao contrário, me empurra na descoberta (nos livros, na net, nas conversas com os idosos da minha idade) dos males que me afligem e que são o desânimo dos médicos.
A idade? A PDI, a p… da idade? Uma enorme chatice, diria mesmo mais, seguindo os meus impulsos franceses, “une véritable m…”.

O conto do vigário.



 “Vivia há já não poucos anos, algures, num concelho do Ribatejo, um pequeno lavrador, e negociante de gado, chamado Manuel Peres Vigário.
Da sua qualidade, como diriam os psicólogos práticos, falará o bastante a circunstância que dá princípio a esta narrativa.
Chegou uma vez ao pé dele certo fabricante ilegal de notas falsas, e disse-lhe: «Sr. Vigário, tenho aqui umas notazinhas de cem mil réis que me falta passar. O senhor quer? Largo-lhas por vinte mil réis cada uma.» «Deixa ver», disse o Vigário; e depois, reparando logo que eram imperfeitíssimas, rejeitou-as: «Para que quero eu isso?», disse; «isso nem a cegos se passa.» O outro, porém, insistiu; Vigário cedeu um pouco regateando; por fim fez-se negócio de vinte notas, a dez mil réis cada uma.
Sucedeu que dali a dias tinha o Vigário que pagar a uns irmãos negociantes de gado como ele a diferença de uma conta, no valor certo de um conto de réis. No primeiro dia da feira, em a qual se deveria efectuar o pagamento, estavam os dois irmãos jantando numa taberna escura da localidade, quando surgiu pela porta, cambaleando de bêbado, o Manuel Peres Vigário. Sentou-se à mesa deles, e pediu vinho. Daí a um tempo, depois de vária conversa, pouco inteligível da sua parte, lembrou que tinha que pagar-lhes. E, puxando da carteira, perguntou se, se importavam de receber tudo em notas de cinquenta mil réis. Eles disseram que não, e, como a carteira nesse momento se entreabrisse, o mais vigilante dos dois chamou, com um olhar rápido, a atenção do irmão para as notas, que se via que eram de cem. Houve então a troca de outro olhar.

            


O Manuel Peres, com lentidão, contou tremulamente vinte notas, que entregou. Um dos irmãos guardou-as logo, tendo-as visto contar, nem se perdeu em olhar mais para elas. O vigário continuou a conversa, e, várias vezes, pediu e bebeu mais vinho. Depois, por natural efeito da bebedeira progressiva, disse que queria ter um recibo. Não era uso, mas nenhum dos irmãos fez questão. Ditava ele o recibo, disse, pois queria as coisas todas certas. E ditou o recibo – um recibo de bêbedo, redundante e absurdo: de como em tal dia, a tais horas, na taberna de fulano, e «estando nós a jantar (e por ali fora com toda a prolixidade frouxa do bêbedo...), tinham eles recebido de Manuel Peres Vigário, do lugar de qualquer coisa, em pagamento de não sei quê, a quantia de um conto de réis em notas de cinquenta mil réis. O recibo foi datado, foi selado, foi assinado. O Vigário meteu-o na carteira, demorou-se mais um pouco, bebeu ainda mais vinho, e daí a um tempo foi-se embora.
Quando, no próprio dia ou no outro, houve ocasião de se trocar a primeira nota, o que ia a recebê- la devolveu-a logo, por escarradamente falsa, e o mesmo fez à segunda e à terceira... E os irmãos, olhando então verdadeiramente para as notas, viram que nem a cegos se poderiam passar.
Queixaram-se à polícia, e foi chamado o Manuel Peres, que, ouvindo atónito o caso, ergueu as mãos ao céu em graças da bebedeira providencial que o havia colhido no dia do pagamento. Sem isso, disse, talvez, embora inocente, estivesse perdido.
Se não fosse ela, explicou, nem pediria recibo, nem com certeza o pediria como aquele que tinha, e apresentou, assinado pelos dois irmãos, e que provava bem que tinha feito o pagamento em notas de cinquenta mil réis. «E se eu tivesse pago em notas de cem», rematou o Vigário «nem eu estava tão bêbedo que pagasse vinte, como estes senhores dizem que têm, nem muito menos eles, que são homens honrados, mas receberiam.» E, como era de justiça foi mandado em paz.

O caso, porém, não pôde ficar secreto; pouco a pouco se espalhou. E a história do «conto de réis do Manuel Vigário» passou, abreviada, para a imortalidade quotidiana, esquecida já da sua origem.
Os imperfeitíssimos imitadores, pessoais como políticos, do mestre ribatejano nunca chegaram, que eu saiba, a qualquer simulacro digno do estratagema exemplar. Por isso é com ternura que relembro o feito deste grande português, e me figuro, em devaneio, que, se há um céu para os hábeis, como constou que o havia para os bons, ali lhe não deve ter faltado o acolhimento dos próprios grandes mestres da Realidade – nem um leve brilho de olhos de Macchiavelli ou Guicciardini, nem um sorriso momentâneo de George Savile, Marquês de Halifax”.
Contado por Fernando Pessoa.
Publicado pela primeira vez no diário Sol, Lisboa, ano I, nº 1, de 30/10/1926, com o título de «Um Grande Português». Foi publicado depois no Notícias Ilustrado, 2ª série, Lisboa, 18/08/1929, com o título de «A Origem do Conto do Vigário».

A grande porca.

Já em 1900 era assim:


Parece-me que hoje nada mudou e que, pelo contrário, piorou.
Está tudo à mesa do Estado numa chafurdice inimaginável. A corrupção, o compadrio, o neopotismo, a partidarite. A política? Uma grande porca com porquinhas e porquinhos a mamar o Estado.

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

O rei vai nu, Greta Thunberg


Todos conhecem ou deveriam conhecer a história.
Uns charlatães convenceram a corte e o rei serem possuidores de um tecido lindíssimo só visto por pessoas inteligentes, os parvos e estúpidos não tinham capacidades para o ver.
Os alfaiates aldrabões fizeram com o tecido mágico (que era o nada) uma roupagem para o rei destinada a um especial cortejo e apressaram-se a divulgar a ideia que tal sumptuosa vestimenta era só visível para os súbditos inteligentes. Os que não conseguiam ver a maravilha eram simplesmente estúpidos. 
                   


No alto de uma árvore estava empoleirado um
menino a quem não haviam explicado as propriedades mágicas da roupagem do rei... Ele olhou, não viu roupa nenhuma, viu o rei nu exibindo a sua enorme barriga e as suas nádegas murchas. Ficou horrorizado e não se conteve. Deu um grito que a multidão inteira ouviu:
«O rei vai nu!». 
Silêncio profundo. E uma gargalhada mais ruidosa que uma salva de artilharia. Todos gritavam enquanto riam: «O rei vai nu, o rei vai nu...». 
É o que acontece hoje com o fenómeno de uma menina sueca de 16 anos de seu nome Greta Thunberg. 



Esteve em todos os aerópagos internacionais: ONU, Parlamento Europeu, Vaticano, Forum Económico de Davos, etc. Recebida quase com “honras de Estado”.
Mas quem é esta menina? É uma adolescente sueca, activista ambiental, que falta às aulas desde 2018 apelando à realização de “greves escolares pelo clima”. Se a moda pega, a greve dos professores será uma minudência.
Foi diagnosticada com o síndroma de Asperger o que corresponde a um “transtorno obsessivo e compulsivo”, não se sabendo se é ou não uma condição distinta do “autismo altamente funcional”.
A adolescente, que teve especial atenção de Guterres, do Papa Francisco, de Sassoli, etc. é uma menina autista, uma adolescente diferente.
O seu discurso não traz nada de novo e que o cientista ou mesmo o cidadão comum não saiba, mas a importância mediática que lhe é dada prejudica a causa importantíssima que é a defesa do clima. 
Esta defesa é uma responsabilidade dos governantes porque só eles têm o poder para alterar os actuais factores que influenciam directamente a situação climática do planeta. 
Se nada for feito, como nos passados quase 30 anos (Conferência de 1992 das NU sobre a Mudança Climática), está-se a caminho de uma catástrofe ambiental que afectará grandemente as gerações futuras. É necessária uma empenhada e urgente acção política e, por mais que isso custe, a menina e tudo e todos que constituem o seu séquito são totalmente irrelevantes. 
”Ser diferente é um superpoder”... exclamou ela. Ela pequena cidadã é, de facto, diferente e não deveria merecer a obsessiva e exagerada atenção dos media que, pelos seus objectivos comerciais (a guerra das audiências e das tiragens) e seguindo a regra de ouro de dar ao povo o que ele mais gosta (como, por exemplo, o futebol e as telenovelas), não vêem o evidente: Greta só tem roupagem mágica, ou seja, nenhuma. “O génio vai nu”! 


E o Presidente Marcelo? O que também segue aquelas regras no seu comportamento político e que se pronuncia por tudo e por nada na sua qualidade de mais alto magistrado da nação, que diz ele? Depois de se abster de discursar no 1º de Dezembro, julgo por o tema ser muito delicado para com a nossa vizinha Espanha - a qual, entre outras malvadezas (que não são de hoje), corta o caudal dos nossos rios (os quais passaram por isso à categoria de torneiras) -  teve a preocupação de elogiar a Greta mas recusou-se a “tirar proveito” da sua passagem por Lisboa para não ser acusado de “aproveitamento político” (!).
Sim, Greta veio a Lisboa no fim de umas férias de 21 dias, em catamaran, a atravessar o Atlântico. Foi recebida pelo Presidente da Câmara, deputados e outros notáveis, mas populares eram muito poucos. Depois, irá, improvavelmente montada no burro que lhe foi ofertado pela cidade de Toledo, discursar em Madrid.
Ó Greta, ainda acabas por ser condecorada pelo Marcelo e a ser candidata a Prémio Nobel ou ser capa no “TIME”.
                       “Greves escolares pelo clima”
Já agora pergunto: o que pensam os pais? Suspeito que a empurram.