segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

A Ilha do Corvo e a sua estátua equestre


Sinto uma particular fascinação e curiosidade por relatos que são considerados próprios de lendas mas sobre as quais a história levanta fundadas dúvidas, suscitando polémica e não o trocista sorriso do erudito. A história da existência de uma estátua equestre na Ilha do Corvo que teria sido erigida no século XV e hoje desaparecida é um desses casos.
Gaspar Frutuoso (historiador açoriano,1522-1591, que se destacou pela sua obra “Saudades da Terra”  que contém uma pormenorizada descrição dos arquipélagos dos Açores, Madeira e Canárias e, também, referências ao de Cabo Verde, refere no vol.6 da referida obra a existência na Ilha do Corvo de uma misteriosa estátua de um cavaleiro apontando para Oeste.

"...um vulto de um homem de pedra, grande, que estava em pé sobre uma laje ou poio, e na laje estavam esculpidas umas letras, e outros dizem que tinha a mão estendida ao nor-nordeste, ou noroeste, como que apontava para a grande costa da Terra dos Bacalhaus [Terra Nova]; outros dizem que apontava para o sudoeste, como que mostrava as Índias de Castela [Antilhas] e a grande costa da América com dois dedos estendidos e nos mais, que tinha cerrados, estavam uma letras (...) que ninguém sabia ler (...)”. 
Também Damião de Góis (1502-1574) na sua “Crónica do Príncipe D. João” escreve, no Cap. IX (“Em que o autor trata de algumas particularidades das Ilhas dos Açores e de uma antigualha que nelas achou”trata de algumas particularidades das Ilhas dos Açores e de uma antigualha que nelas achou”):   
Estão estas ilhas lesteoeste da rocha de Sintra, e são perto de dez(....) Destas ilhas a que mais alto está ao norte é a do Corvo que terá uma légoa de terra(...) os marecantes lhe chamam ilha do Marco porque com ela (por ter uma serra alta) se demarcam (...) No cume desta serra, da parte noreste, se achou uma estátua de pedra posta sobre uma laje, que era um homem em cima de um cavalo em osso, e o homem vestido de uma capa de bedém, sem barrete, com uma mão na crina do cavalo, e o braço direito estendido, e os dedos da mão encolhidos, salvo o dedo segundo, a que os latinos chamam índex, com que apontava contra o poente(...). 
Esta imagem, que toda saía maciça da mesma laje, mandou el-rei D.Manuel tirar pelo natural (...) e depois que viu o debuxo, mandou um homem engenhoso (...) que fosse a esta ilha, para (...) tirar aquela antigualha (...)a verdade foi que a quebraram por mau azo; e trouxeram pedaços dela (...); o que tudo esteve na guarda-roupa de el-rei alguns dias, mas o que depois se fez destas coisas, ou onde puseram, eu não o pude saber.(...). 
Gavin Menzies (oficial da marinha britânica e que nessa qualidade percorreu as rotas dos navegadores do passado) no seu livro “1421- The Year China Discovered the World” (objecto de muita contestação do mundo científico), descreve as viagens do almirante chinês Zheng-He (ou Cheng-Ho) (1405-1433), as quais, para além da exploração dos oceanos Índico e Pacífico (confirmadas pelos historiadores) teriam incluído o Atlântico Sul e Norte. 
Nessas viagens, era costume, segundo Menzies, erigir-se em locais proeminentes uma estátua de um homem a cavalo apontando a direcção da China. “Seria o caso da Ilha do Corvo (...) a primeira que os chineses terão avistado vindos das Américas (...).Os primeiros relatos da chegada dos portugueses em 1430 rezam assim: “ (...) no cume de uma montanha numa ilha a que chamam Corvo...a estátua de um homem montado num cavalo; a sua cabeça está descoberta e é calvo; a mão esquerda está pousada no cavalo e a direita aponta para ocidente. A estátua está firmemente implantada num pedestal de pedra esculpida numa rocha. Na base há inscrições numa escrita que não conseguimos compreender. (Manuel Faria e Sousa, “Epítoma de las Historias Portuguesas, Madrid, 1638).”

                       
                    
               

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