domingo, 26 de fevereiro de 2017

O que o berço não dá.


Ultimamente tem-se assistido por estas bandas a um chorrilho de frases, comentários e atitudes nunca ocorridas na vida da nossa “jovem democracia”.
Não entendo esta designação de “jovem democracia”. A nossa democracia já não é tão jovem como isso e uma rápida comparação com regimes europeus, africanos, asiáticos e sul-americanos comprová-lo-ia.
Quem se esquece da trágica Alemanha de Hitler, da megalómana Itália de Mussolini, da Espanha de Franco com uma guerra civil que deixou marcas até hoje, da URSS, da sangrenta Rússia de Lenine e dos seus “ínclitos” sucessores como Stalin e companhia? Eram ditaduras que nesses tempos mereceram, por medo ou pusilanimidade, a compreensão, o distanciamento ou mesmo o apoio de democracias.
Comparada com aquelas tragédias, que constituem referências históricas e que marcaram para sempre a segunda metade do século XX, a história da última ditadura em Portugal é uma brincadeira de crianças.
Esquece-se, porque tal é politicamente conveniente, que a ditadura de Salazar teve no seu início o apoio incondicional de hoje considerados democratas como Henrique Galvão e Humberto Delgado. Porquê o apoio destas figuras, hoje consideradas símbolos da liberdade, numa altura em que a liberdade de expressão claramente já não existia e a ditadura era plenamente assumida? Porquê a sua revolta tardia? Por profunda reflexão, por zanga, por  ambição, por despeito político?
Para se sentir a importância do tempo na avaliação de figuras da história ou que a ela passarão de modo relevante (não me refiro a figurinhas, actualmente em grande abundância, que em qualquer livro merecerão, quanto muito, duas linhas de rodapé), pense-se no caso de Sebastião José de Carvalho e Melo (meados do século XVIII), ministro poderosíssimo de um fraco rei (D. José I).
Passados mais de dois séculos e meio continua a ser uma personagem controversa, havendo por um lado os que o consideram como um dos grandes estadistas da história de Portugal e, por outro, os que, bem pelo contrário, o caracterizam como tenebrosa figura de um regime ditatorial. Ainda hoje a polémica continua apontando ou ignorando o que de bom houve na sua governação (e foi muito) ou denunciando ou justificando o que foi horrível (e não foi pouco). A celeuma continua e julgo que será para sempre.


A este propósito e como exemplo de cegueira por ódio perene, conto o que me foi dito, nos inícios dos anos 70, quando fazia parte de uma equipa do projecto da extensão do Metropolitano de Lisboa. A dada altura, interroguei por que razão a estação situada na praça “Marquês de Pombal” era designada por “Rotunda” (e assim ficou durante largos anos). Foi-me respondido, com a condescendência que os velhos têm para com os novos, que tal se devia ao facto do então administrador do Metro ser um descendente de um dos martirizados pelo Marquês e que, por isso, tal estação nunca teria o nome do tirano. Mudam-se os tempos, mudam-se os administradores, mudam-se as vontades.
A Salazar, menos de cinquenta anos após a sua morte, foi retirado o seu nome à maior ponte de Portugal (e no seu tempo a maior da Europa e uma das maiores do Mundo), substitui-se o seu nome em ruas, avenidas, praças e pracetas, esconderam-se, demoliram-se ou vandalizaram-se as suas estátuas. Tudo em nome da “vontade popular”, por definição “democrática”, “antifascista” e defensora da “classe operária” (que não existe). 
Um discurso, um comportamento que a história, dentro de poucas gerações, corrigirá. Salazar não teve, nem de longe nem de perto, a crueldade do Marquês ou a de um Pedro “o Cru”, apenas viveu numa época com padrões de avaliação política e ética muito diferentes dos de hoje.
Como se pode negar que Salazar e a sua ditadura, a qual sempre assumiu e nunca negou, regularizou a dramática situação financeira que herdou (o que levou mais de 70 anos), deu, à maneira do seu tempo, paz e segurança ao povo, lidou com uma perigosa situação internacional poupando Portugal aos horrores de uma guerra que deixou um rasto de mais de 70 milhões de mortos? Como se pode negar, ignorar ou esconder o apoio a uma política colonial dos seus antecessores republicanos? É certo que tudo isso foi feito com o sacrifício de liberdades e o atraso em sectores tão importantes como a saúde e a educação.
As ferozes críticas hoje feitas à política salazarista são, na minha opinião, principalmente consequência de uma análise política contemporânea baseada em conceitos e práticas totalmente diferentes das do passado.
Noutro registo, o mesmo acontece com análises, feitas à luz dos princípios de hoje, sobre o suplício dos Távoras ou sobre as cruéis vinganças de Pedro I ou sobre a implacável justiça de João II. Outros tempos.
Esta minha diatribe fez-me esquecer a verdadeira razão deste meu escrito: a inédita situação de insulto político que hoje se vive, que já aqui referi e que os meios de comunicação social gostosamente relatam.
Chegou-se ao ponto de transformar a própria Assembleia da República em arena de injúrias e baixas insinuações a propósito de tudo e de nada. Foi, é, a situação catastrófica do sistema financeiro português com a CGD a liderar o “ranking” mediático, são os resultados da política económica do governo os quais quando são bons são “nossos” e quando maus são “deles”.
E, agora, cereja a coroar o bolo: o anterior secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, após ter negado conhecimento sobre a matéria mas entalado pela realidade, veio agora assumir a responsabilidade “política” da não publicitação e consequente não fiscalização da transferência de 10 mil milhões de euros (!) para paraísos fiscais realizada entre 2011 e 2014 durante o governo PSD/CDS. Uma insignificância vergonhosa, uma espantosa e maravilhosa coisa.
No fundo, tudo é resultado do que hoje faz muita falta em casa, na escola, no trabalho: e-du-ca-ção.
Neste país de doutores verifica-se, no dia-a-dia, que “o que o berço não dá Salamanca não ensina” e a política longe de ser uma excepção é um dos expoentes da corrupção, do compadrio, da mentira, do roubo e de falcatruas de todo o género.

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Usucapião? Sorria.



Usucapião: do latim “usocapio” – adquirido pelo uso.

Por cá nada de novo. Até enjoa.
É o futebol, é claro, e as trapalhadas entre o Governo e a Oposição com o presidente Marcelo a acicatar a direita com um diário e sorridente apoio às políticas e decisões do Primeiro António Costa. Por vezes lembram-me o Sr. Feliz e o Sr. Contente da comédia dos anos70.
(https://www.youtube.com/watch?v=L3vCCnxFg4Q) .
Ontem foram os casos da taxa social única, do deficit, da taxa de desemprego que foram objecto de rasgados elogios de MRS, o qual continua a pronunciar-se sobre tudo e sobre nada fingindo mefistofelicamente equidistância.
Mas há assuntos recorrentes para além do futebol.
A Caixa Geral de Depósitos, por exemplo. Quando todos pensavam que o assunto estava encerrado ele voltou à baila com insultos, ameaças e defesas da honra como há muito não se via. És um mentiroso, ou confessas ou vais para tribunal, mentiroso. Eu? Nunca! Isto é um vil atentado à minha honra. No século XIX já teria havido bofetadas de luva, duelo e testemunhas.
O pobre Coelho, “O Ressabiado”, continua assim e deve interrogar-se diariamente que mal terá feito a Deus. A Deus não sei mas a Marcelo e aos amigos deste no PSD certamente e Marcelo não esquece as afrontas sofridas, sobretudo se públicas. Enfim, politiquices, miseráveis politiquices num país que tanto precisa de políticas.
Dizem-me, até, que o relevante tempo de passagem pelo poder do Pedro incita-o a lá voltar, não por via parlamentar ou eleitoral mas exclusivamente por via jurídica. Parece que irá invocar, em sessão extraordinária da Assembleia da República expressamente convocada para o efeito, a figura jurídica do “usucapião” (Artigo 1287º do Código Civil). É preciso não ter a noção da salada! Provavelmente inspirou-se na última decisão do Trump, outra das estrelas dos nossos noticiários.
 

É verdade. Segundo a CNN do passado dia 9, Trump à sua partida para Los Angeles fez esta espantosa declaração “… todo o investimento realizado durante décadas pêlos americanos na base aérea e espaço envolvente e o não cumprimento das regras básicas de manutenção da ilha por parte de Portugal dá aos EUA o direito à posse do território por usocapio…” (tradução livre). O tratado foi assinado durante a 2ª Guerra Mundial pelo Marechal Óscar Carmona e o Presidente Franklin D. Roosevelt, ou seja há mais de 70 anos período este de ocupação que ultrapassa em muito o tempo de 25 anos contemplado no Código Civil.
Ora valha-nos Deus, a ilha Terceira tem uma superfície de 400 km2 e os EUA de 9.371.175 km2. “Make América great again” tá bem mas não com tão pouco e à custa de terceiros! MRS telefonou de imediato para a Casa Branca, como seria de esperar, mas nada foi divulgado sobre o resultado da conversa. Só nos faltava esta e espero que o Coelho antes de invocar o “usocapio” pense duas vezes (ou vez e meia se consultar o Relvas) e não afecte a estabilidade do actual sistema político que tanto trabalho deu a MRS e a Costa+Jerónimo+Catarina e o Trump que tenha juízo e que não se intrometa nos assuntos internos portugueses, tais como as Lajes e a Caparica. Sim, a Caparica.
 

Pode ler-se: “Decreto que o Cristo-Rei deve imediatamente baixar os braços. Chega de receber toda a gente de braços abertos, especialmente os imigrantes de Lisboa. Make Caparica great again.”.


Que pena estarmos ainda só em meados de Fevereiro e longe do dia 1 de Abril…