domingo, 27 de março de 2016

Uma tragédia na emigração.


Não quero comentar em pormenor a tragédia ocorrida no passado dia 25 de Março em que morreram 12 emigrantes portugueses num desastre rodoviário em França.
Para além de não poder nem querer antecipar as conclusões da comissão de inquérito nomeada pelas autoridades francesas, o comentário teria muito de “políticamente incorrecto” e estaria ao arrepio das convicções de hoje de muitos dos meus concidadãos, nas quais o fado se mistura, à ignorância dos factos e ao azar.
No entanto, os órgãos de comunicação social começam a “corrigir o tiro” informando que o pequeno autocarro estava com o dobro da sua lotação, que uma imprudente ultrapassagem está ao mesmo nível de probabilidade da de uma desatenção por cansaço, que o jovem condutor de 19 anos (já constituído arguido) - com carta há apenas um ano e sem maturidade e experiência - poderia não estar habilitado para conduzir aquele tipo de veículo (o qual tinha um atrelado o que muito perturba a condução), que o veículo fazia parte de um “combóio” de mais quatro podendo ter havido imprudente pressa em os apanhar da que resultou eventualmente excesso de velocidade numa das estradas mais mortíferas de França.
Estou, no entanto, certo que houve irresponsabilidade e ilegalidade.
Uma tragédia com uma dimensão nunca atingida no passado, uma Páscoa triste para a comunidade emigrante portuguesa, para os familiares e amigos das vítimas e para todos nós.

terça-feira, 22 de março de 2016

De novo a Besta


“E eu pus-me sobre a areia do mar, e vi subir do mar uma besta (...). Quem é semelhante à besta? Quem poderá batalhar contra ela? (...) e deu-se-lhe  poder sobre toda a tribo, e língua, e nação.(...).Se alguém tem ouvidos, ouça.(...).
Se alguém matar à espada, necessário é que à espada seja morto.(...).

Apocalipse 13:1-18.

22 de Março de 2016. Eram 8 da manhã em Bruxelas.
A Besta atacou o metropolitano cheio de trabalhadores  a caminho do emprego, crianças e adolescentes dirigindo-se a escolas e faculdades. Cidadãos cujo crime é o de serem apenas isso.

A Besta também atacou na mesma hora o aeroporto na zona de ”check in”, hora em que habitualmente se prepara a partida para os vôos transatlânticos. "Não ataquem grandes edifícios como o World Trade Center, instalações militares como o Pentágono. Isso já não interessa: ataquem gente, espalhem o terror." Foi esta a orientação dada por um agente da Besta.
Hoje, é patente a impotência, a desorientação, o medo. A Besta ganhou outra batalha. Ganhará a guerra?
Que fazer? Um enorme muro e transformar a Europa numa frágil fortaleza? Expulsar os migrantes suspeitos de coniventes da Besta misturando o trigo com o joio?
“Matai-os todos que depois Ele saberá distinguir os bons dos maus” foram as ordens de Simon de Beaufort na cruzada papal contra os Cátaros no sul da França na segunda década do século XIII. Matar, expulsar todos (por avião, barco ou combóio) como fizeram no passado os nazis? É claro que não como em 1220 e em 1940 mas não esquecer o passado porque a Besta está, de facto e dizem que em resultado do “pecado original”, em maior ou menor grau dentro de nós.
Para já, avança-se com a construção de muros fronteiriços e com políticas incompetentes para estancar a corrente de refugiados. A Europa não sabe ou não quer lidar com o problema. Entretanto, são milhões a migrar, milhares no caminho da fuga, centenas a morrer no Mediterrâneo, cidades demolidas, património mundial destruído, pacíficos cidadãos mortos em Londres, Paris, Madrid, Bruxelas. Será possível abraçar quem desconfiamos?
Resolver a questão Síria? Sim, certamente, mas não só. Há tantas sírias em potência! A Líbia, a Etiópia, o Iraque, o Afeganistão e, e, e ...
O problema é essencialmente político sendo as declarações políticas de solidariedade inconsequentes e sempre as mesmas.
Quem compra petróleo à Besta? Quem? Quem vende explosivos, armas à Besta? Quem, quem? As organizações de segurança europeias ainda não sabem?! Já era tempo. Quem organiza a Besta?
A Europol estima que haja entre 3.000 e 5.000 europeus com ligações ao extremismo islamita...
Porque não há (ainda até hoje) estreita cooperação entre as agências de informação ocidentais? (só hoje tomei conhecimento da importância do papel das autoridades marroquinas no combate ao terrorismo). Para quando a criação de um organismo europeu integrado de segurança?
“Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem. Seu número é seiscentos e sessenta e seis”, é o que diz uma das traduções do versículo 18.
A partir de então, os conhecedores das Escrituras passaram a associar o número "666" à Besta e a tudo o que está relacionado com o maligno, porque por hermeneutica (atribuição de um valor numérico a cada palavra) “616” (número do homem Calígula) é, segundo os especialistas, o número da Besta (e não “666”, mais fácil de reter). Porque não 4, o número da morte para a hermenêutica asiática?
Se alguém matar à espada, necessário é que à espada seja morto.

sexta-feira, 11 de março de 2016

A Ética e a loirinha




A ética na actividade humana, desde a “verdade desportiva” à  “promessa política” é frequentemente associada à corrupção.
Para que haja entendimento, o que se entende por ética em qualquer actividade humana?
É difícil nos tempos de hoje definir sem controvérsia o que caracteriza e é próprio da ética mas poder-se-á dizer que “Ética” é um conjunto de princípios morais que governam o correcto comportamento de um indivíduo ou de uma organização ou, mais concretamente, “é um conjunto de valores que definem o quero, o posso e o devo. Porque nem tudo o que eu quero eu posso, nem tudo o que eu posso eu devo e nem tudo o que eu devo eu quero”.  
A ética reconhece-se quando é vista e ou se a tem ou não se a tem e a reputação ou o bom-nome dependem dela.
Vem isto a propósito de uma recente contratação de um político no activo e ex-governante que é, na minha opinião, a negação da ética política, tal como a falta de “fair play” é a negação da ética desportiva . 
Alguns comentadores políticos equipararam o comportamento do político em causa não como uma infracção à ética mas como uma mera falta de bom-senso. É caso para dizer que alguns argumentos políticos são mais retorcidos do que a casca de um caracol.
Mas, para além do bom-senso, o comportamento ético é por vezes  aferido em função da observância da Lei: tal comportamento é conforme à Lei? Então nada há a apontar no domínio da ética. Não é assim e a utilização daquela dualidade é em si mesmo a tradução de uma cumplicidade com quem tem um comportamento éticamente reprovável.

Certamente que transparência nas decisões e honestidade nos comportamentos constam numa definição de ética e nada melhor para um entendimento parcial da questão do que elencar um pequeno e resumido conjunto do que é ou do que deveria ser.
“Ser” ético é:
- Ser honesto, imparcial e servir fielmente o bem-público;
- Ser exemplo de competência e de prestígio;
- Ter um comportamento honrado, íntegro e digno;
- Abster-se de  qualquer declaração, crítica ou argumento inspirados por interesses de terceiros;
- Evitar qualquer tipo de conflito de interesses recusando participar em circunstâncias que possam influenciar um seu juízo ou a idoneidade de um seu comportamento;
- Recusar qualquer compensação por mais do que uma das partes envolvidas numa mesma questão, nomeadamente quando nessas questões se têm ou se tiveram funções de responsabilidade;
- Não utilizar informação confidencial obtida na sua actividade profissional com o objectivo de obter lucro ou promoção pessoal , nomeadamente em detrimento do interesse público.
Os políticos deveriam ser exemplos de comportamento ético em todas as áreas da sua actividade. Mas, em geral, não o são (como é comprovado pelos processos jurídicos a que estão ou estiveram sujeitos políticos, desde autarcas a ministros) e, tal como em certas associações profissionais, os que desejam exercer cargos públicos deveriam ser submetidos a um exame de ética para efeitos de desempenho de funções. Não me admiraria que, mau grado o voto do cidadão eleitor, houvesse um considerável número de reprovações.
Ref. “A Ética hoje”, blog de 9/11/2015, "A loirinha do Schauble", blog de 26/02/2015.


segunda-feira, 7 de março de 2016

Eu e os apanhados




Nada de relevante se passa por estas bandas, excepto as controvérsias sobre o Orçamento do Estado, a tomada de posse do novo Presidente da República, a escandalosa contratação da ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque pela empresa Whitestar que comprou os créditos malparados do Banif na sua altura sob tutela do ministério das finanças e, claro, o futebol. Estou a reestudar as ondas gravitacionais e se chegar a conclusões que a minha saudosa avó pudesse compreender, informarei. Até lá e como o lema deste "blog" é "quase nada de um pouco de tudo", aqui vai, para distracção, esta historieta.
                                                                                                                                                                                                     
Andei mais de quatro anos com uma artrose da anca, diagnosticada e diagnosticada por um querido amigo meu, reputado médico especialista na matéria.
Li tudo sobre a patologia, desde as enciclopédias aos anúncios, passando por artigos em livros e revistas da especialidade. Falei com todos, não esquecendo os fanáticos das medecinas alternativas. Tomei de tudo, desde o tutano de vaca (que rejeitei sem saudades logo que accionado o alerta da “bse”) até à infalivel, miraculosa e caríssima barbatana de tubarão, não tendo conseguido (na altura para meu desespero) experimentar um celenterado habitante dos mares do Japão considerado como poção miraculosa.

Ginastiquei e fui manipulado pelos mais famosos especialistas imigrados em terras lusitanas.
Ela foi uma polaca, ele foi um japonês, eu sei lá. Acabei nas brutas mãos de um catalão. Resultados? Dez elevado a menos seis…
Quando no metropolitano se começaram a levantar para me darem o lugar, quando comecei a levar comiseradas palmadinhas nas costas e, sobretudo, quando uma auto-medição da minha coxa revelou uma atrofia de três centímetros, só então decidi entregar-me sem reticências ou reservas nas mãos da medicina ocidental.
Consultei dois cirurgiões. Um de gabinete luxuoso, secretária loira de modos distantes, agenda electrónica, computadores de bolso e de mesa, óculos de aros de “design” exclusivo, lacinho à gato e falas atenciosomodernas. Outro, modesto e afável nas pobres instalações de um hospital público. Foi este que eu escolhi para meu talhante.
Escutei com muita atenção as respostas às dúvidas e certezas do meu “saber” de miserável engenheiro.
Que não, que as minhas reservas a uma futura “revisão“ (fiquei a saber que nós humanos somos, em certos casos, para a medicina como os carros) não tinham razão de ser, uma vez que as técnicas da artroplastia da anca tinham evoluído muito nos últimos anos.
Não não, não me iria ser cortada a cabeça do fémur. Este, iria ser simplesmente “lapidado” e sobre a resultante jóia seria cravada uma esfera de aço com um coeficiente de atrito incrivelmente baixo. 
Os termos “esfera“ e “atrito“ foram (é hoje a minha convicção) decisivos na minha aquiescência (o espírito de engenheiro tem coisas destas).
Depois, ficar na lista das primeiras três mil operações europeias do género e a segunda cá da terra (segundo ele), buliu com a minha vaidade que naquela ocasião se revelou angustiada e sem que eu a pudesse ignorar. Mergulhei assim na fatalidade cirúrgica: decidido mas contrariado.
Estive várias semanas “de molho”, dependente de tudo e de todos.
Media diária e obsessivamente o perimetro da minha coxa esquerda transformada num trambolho de tronco, seguia hiperdisciplinada e cronometricamente as instruções para os exercícios diários de fisioterapia, inventava processos para sair da cama, tomar banho, pôr as meias.
Depois do que passei, confesso que quase teria preferido ficar como nasci e não fazer parte da moderna mestiçagem homem-máquina, orgulho da ciência médica e canhestra forma da inatingivel imortalidade. Quando, ao fim de intermináveis semanas recuperei a minha independência, ela era condicionada por um par de canadianas. Tinha chegado a altura de, autonomamente, arriscar-me a operações mais complicadas como, por exemplo, ir sózinho às compras. E lá fui eu.
Despreocupado fui enchendo o carro de compras.
Chegado ao fim verifiquei pelo volume que não é em vão que se está tanto tempo fora de casa e, confesso, só então me apercebi de óbvias e concretas limitações. Burrices.
Cá fora e a uma consideravel distância do meu carro, estacionado na rua junto ao passeio  com o beneplácito de uma senhora polícia para com o “tadinho“, colocou-se o problema do transbordo. Pensei que se a polícia se tinha mostrado tão compreensiva, certamente que o anónimo e sensivel cidadão também e, de facto, ele apareceu na forma de um simpático jovem que vinha calmamente pelo passeio na minha direcção.
A ele me dirigi quase suplicante, gesticulando com as canadianas apontando o meu carro e pedindo o favor de me ajudar a descarregar as compras.
A imediata disponibilidade inicial foi repentinamente substituida por gargalhadas cúmplices e por uma firme mas divertida recusa:
“Querias? Querias? Tu e os apanhados da TV! “Não, não...”  e desapareceu a rir.